O ministro Celso de Mello, que será o fiel da balança sobre os
embargos infringentes no julgamento do mensalão, indicou, no ano
passado, ser favorável ao recurso que pode levar a um novo julgamento de
alguns réus. Na primeira sessão do mensalão no Supremo Tribunal Federal
(STF), em 2 de agosto de 2012, o ministro da Corte explicou que o
regimento interno do STF tem força de lei e que as normas sobre embargos
infringentes ainda estão em vigor.
“O Supremo Tribunal Federal, em normas que não foram derrogadas e que
ainda vigem, reconhece a possibilidade de impugnação de decisões de
mandados do plenário desta Corte em sede penal, não apenas os embargos
de declaração, como aqui se falou, mas também os embargos infringentes
do julgado, que se qualificam como recurso ordinário dentro do Supremo,
na medida que permitem a rediscussão de matéria de fato e a reavaliação
da própria prova penal”, disse o decano.
Último a votar, Celso de Mello desempatará na quarta-feira que vem o
placar de cinco a cinco pelo cabimento ou não dos embargos infringentes.
Parte dos ministros admite ser válido um artigo do regimento interno do
Supremo, segundo o qual um condenado pode solicitar a reanálise do caso
quando obtiver pelo menos quatro votos pela sua absolvição. Já outros
ministros acreditam que os embargos infringentes não foram previstos na
lei 8.038, de 1990, que regulou normas procedimentais dos tribunais
superiores.
A afirmação de Celso de Mello sobre o recurso foi feita na análise de um
pedido preliminar do advogado Márcio Thomaz Bastos, advogado do
ex-dirigente do Banco Rural José Roberto Salgado, no primeiro dia do
julgamento. O defensor queria o desmembramento do processo, devendo ser
julgado na Suprema Corte apenas aqueles réus que detinham foro
privilegiado.
Bastos, que foi ministro da Justiça durante o governo de Luiz Inácio
Lula da Silva, ressaltava que o julgamento afrontava o princípio do juiz
natural e do duplo grau de jurisdição - a possibilidade de recorrer da
sentença a outras instâncias.
Diante de manifestações favoráveis ao desmembramento, Celso de Mello fez
uma longa análise para afastar a tese de que os réus seriam
prejudicados em um julgamento apenas pelo STF. Para isso, citou os
embargos infringentes. Lembrou ainda que os infringentes serão relatados
por outro ministro - excluídos Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski,
que foram, respectivamente, relator e revisor da ação penal.
“Opostos a um acórdão majoritário do STF que tenha julgado procedente
uma ação penal originária, admitidos pelo relator da causa e havendo
impugnação, serão os autos remetidos a um outro relator”, afirmou Celso,
ao ler parte do regimento interno do STF.
Abordado por jornalistas no fim do julgamento desta quinta-feira, Celso
lembrou ter tratado da matéria na primeira sessão e em outra ocasião,
onde não reconheceu os infringentes pela inexistência de quatro votos
vencidos.
“Eu cuidei especificamente dessa matéria em duas oportunidades. Uma
delas neste próprio processo, no dia 2 de agosto de 2012, quando foi
suscitada questão formal que tornou necessário discutir ou debater esse
tema, em caráter de pertinencia daquele meu pronunciamento, no inicio
desse julgamento e também posteriormente, como relator de embargos
infringentes em determinada ação penal, que da verdade deles não
reconheci pela ausência de quatro votos vencidos”, disse.
O decano evitou, no entanto, antecipar se mudará o voto depois da sessão
dividida. "Atento a isso e ao que escrevi em 2 de agosto, estou
considerando todos esses aspectos. Na verdade já formei minha convicção.
Tenho a convicção formada e vou expô-la de modo muito claro, muito
aberto na quarta-feira", disse.
O ministro também citou que a Constituição estabelece garantias para
pessoas que sofrem acusações criminais. "Nós sabemos que o processo
penal, no contexto do Estado Democrático de Direito, rege-se por
determinadas prerrogativas e garantias que a Constituição da República
estabelece, impondo limites à ação do Estado e fixando direitos básicos
em favor das pessoas que sofrem acusações criminais”, afirmou.
Uma eventual admissão dos embargos infringentes no julgamento do
mensalão não provocaria uma reabertura completa do julgamento. Apenas
seriam reexaminados aqueles casos nos quais há pelo menos quatro votos
vencidos – como ocorreu no julgamento de parte dos réus por formação de
quadrilha e lavagem de dinheiro.
Os réus que seriam beneficiados com o novo julgamento seriam: João Paulo
Cunha, João Cláudio Genu e Breno Fischberg, condenados pelo crime de
lavagem de dinheiro; e José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoíno, Marcos
Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, José Roberto Salgado e Kátia
Rabello, condenados por formação de quadrilha.